A
Astrologia tem a capacidade de descrever sobre as áreas mais complexas e
obscuras da vida com uma brilhante clareza sintética e com uma consideração
clemente pelos dois lados que existem sempre em qualquer história.
No
programa de hoje exploro um dos padrões humanos mais complexos, analisando as
relações onde existem três lados.
Os
triângulos relacionais são uma dimensão arquetípica da vida humana.
(Arquetípica:
Todo e qualquer tipo de padrão ou modelo; exemplo ou paradigma.)
Não
podemos escapar-lhes, de uma forma ou doutra e temos também tendência a
geri-los mal, quando eles entram nas nossas vidas, o que é compreensível dado
que os triângulos normalmente invocam emoções muito dolorosas,
independentemente da posição que nele ocupamos.
Podemos
ter de enfrentar sentimentos como ciúme, humilhação e traição.
Ou
podemos ter de viver sentindo que somos traidores, desonestos e que
magoamos alguém.
Podemos
sentir todas estas coisas ao mesmo tempo, e podemos ter a convicção de ser uns
falhados.
As
emoções envolvidas nas relações triangulares são muitas vezes angustiantes e
destrutivas para a auto-estima.
E dado que os triângulos nos obrigam a
enfrentar emoções muito difíceis, descobrimo-nos habitualmente a tentar culpar
alguém pela existência de um triângulo nas nossas vidas, seja que nos culpemos
a nós próprios ou a uma das outras duas pessoas envolvidas.
Mas os
triângulos são efectivamente arquétipos – e, se temos dúvidas sobre a sua
universalidade, basta-nos ler a literatura dos últimos três mil anos.
Todo e
qualquer arquétipo nos oferece um mundo de padrões determinados e de
inteligente desenvolvimento interior e existe algo na experiência do triângulo
que a torna, por mais desagradável e dolorosa que seja, um dos mais poderosos
meios de transformação e crescimento de que dispomos.
Lealdades
divididas
Mesmo na
família mais feliz e emocionalmente estável podemos sentir tanto um amor
profundo como uma intensa rivalidade em relação a um dos progenitores. Podemos
encontrar, por exemplo, Vénus na 4.a casa e a Lua na 10.a; é o caso do mapa
astral do Príncipe Carlos de Inglaterra, que ofereceu um dos mais famosos
triângulos dos tempos modernos.
Com uma
tal configuração pode existir uma forte identificação com o rival.
A criança
pode acabar na posição do Traidor, assim como do Instrumento de Traição.
O que a
leva a sentir-se mal consigo própria e, por isso, algo terá provavelmente de
ser reprimido;
para um
ego jovem é simplesmente impossível lidar com uma tal ambivalência.
Se se
exprimir o planeta Vénus na 4.a, com todas as suas implicações de amor pelo
pai, iremos magoar e trair a mãe.
E se a
Lua está na 10a, como podemos fazer tal coisa a alguém com quem nos
identificamos tanto?
Assim,
podemos reprimir Vénus, e mais tarde na vida podemos acabar por entrar num
triângulo sem perceber qual o modelo infantil que o alimenta.
Ou
podemos reprimir os sentimentos pela mãe.
Podemos
transformar-nos nuns "estraga-famílias", como se dizia no tempo em
que ainda existiam casamentos. Um "estraga-famílias", a nível
psicológico, é uma pessoa que se introduz numa relação estável, não só motivada
por um afecto e desejo genuínos pelo objecto de amor, mas também por uma
necessidade compulsiva de ocupar o papel do rival com quem secretamente se
identifica.
É muito
difícil reconhecer um modelo do género em nós próprios.
Se
acabamos por cair no papel de Instrumento de Traição, gostaríamos de pensar que
nos apaixonámos verdadeiramente por alguém e o facto que esse alguém tenha já
uma relação estável, é tido como mero azar; achamos que essa pessoa cometeu um
erro e casou com a pessoa errada, ou casou-se obrigado/a porque havia um filho
pelo meio ou algo do genero.
Independentemente
da explicação que damos a nós próprios, podemos justificar o nosso papel como
Instrumento de Traição através da desvalorização da ligação já existente.
Isto pode
por vezes revelar-se como profundamente ingénuo e conduz a grandes desilusões e
sofrimento, quando se vem a descobrir que o esposo/a "indesejado"
significa muito mais para o amado do que alguma vez soubemos reconhecer.
Podemos
também descobrir, para o nosso horror, que começamos a comportar-nos
exactamente como o rival desprezado, que inicialmente relegámos ao papel de
"ele/ela só está com ela/ele por causa dos filhos". Quando existem
questões parentais não resolvidas, a pulsão de separar um casal pode ser
extremamente forte – especialmente se o rival é também um amigo próximo, o que
ajuda a recriar os sentimentos do triângulo familiar original.
Podemos
igualmente ver no progenitor coisas não muito encantadoras ou amáveis.
Por
exemplo, um homem com Vénus na 10.a casa pode ter também uma quadratura
Lua-Plutão ou uma oposição Lua-Saturno, ou Vénus em conjunção a Saturno ou
Chiron.
Tais combinações
exprimem duas imagens de mãe muito diferentes; uma amada e linda, a outra
ameaçadora e dolorosa.
Estes
dois atributos têm tendência a manifestar-se, mais tarde na vida, como duas
pessoas
– o Traidor e o Instrumento de Traição.
É a isto
que Jung chamou uma "anima dividida" ou, no seu equivalente feminino,
um "animus dividido". Jung tinha um grande interesse pelas dinâmicas
psicológicas deste modelo porque ele próprio tinha sofrido por causa dele.
Apesar das
suas definições serem, de certo modo, rígidas e de necessitarem de uma maior
flexibilidade nas interpretações, são úteis para nos ajudarem a entender porque
é que precisamos dos triângulos e porque é que os três lados são secretamente
variáveis entre si.
É
provável que as três pessoas sofram pelas mesmas dinâmicas não resolvidas.
A divisão
interior parece ser particularmente forte e levar a triângulos compulsivos
quando opostos aparentemente inconciliáveis aparecem no mesmo amado progenitor.
Existem progenitores em que os opostos não são terrivelmente opostos, mas
também existem outros onde são muito extremos.
Tais
progenitores são fascinantes e com frequência exercem um grande carisma sexual
porque são misteriosos.
O
progenitor é lindo e amado, mas também doloroso, cruel, insensível, devorador
ou de qualquer forma inaceitável.
É muito
difícil para a psique humana aceitar opostos extremos numa pessoa só, portanto
são precisas duas pessoas através das quais viver esses sentimentos
ambivalentes.
Uma
tornar-se-á Vénus e a outra tornar-se-á Plutão, ou Saturno, ou Chiron, ou
Marte, ou Urano.
As
imagens parentais que comunicam extremos opostos podem contribuir para uma
tendência para triângulos na vida adulta.
Envolvemo-nos
com alguém e, com o tempo, essa pessoa começa a assumir a imagem de um dos
extremos do progenitor.
Depois de
vivermos juntos alguns anos, começamos a dizer a nós próprios e aos nossos
amigos, "O meu parceiro é tão possessivo, preciso mesmo de espaço para
respirar", e aí está Vénus na 10a ou na 4a casa, em quadrado com Plutão.
Ou
dizemos "O meu parceiro é tão restritivo e convencional, tenho de me
libertar para poder ser eu próprio/a", e aí está Vénus na 10a com a Lua em
oposição a Saturno.
Sentimos
que não estamos a saborear aquele tipo de relação linda, erótica e divertida
que esperávamos encontrar;
Então
transmitimos a culpa ao parceiro, que faz o papel de Vénus.
O rompimento
é expresso exteriormente mas, de facto, reflecte duas qualidades opostas que
não conseguimos reconciliar na nossa relação com o progenitor.
Claro que
estas divisões relacionadas com os pais, ao nível mais profundo, estão
relacionadas com as qualidades opostas que ainda não resolvemos em nós mesmos.
Todos os
triângulos, incluindo aqueles com origem na familia, relacionam-se, em última
análise, com a nossa própria vida psíquica não-vivida.
Se
fossemos capazes de reconciliar os opostos dentro de nós próprios, poderíamos
então conceder aos nossos pais que fossem contraditórios eles também.
Não há
nada de estranho num progenitor com um adorável, encantador, lado venusiano e,
ao mesmo tempo, um saturnino lado reservado ou um exigente lado plutoniano.
Os seres
humanos são multifacetados e podem amar-nos e ferir-nos;
mas as
contradições dos nossos pais podem parecer-nos intoleráveis se eles próprios
não conseguem enfrentá-las.
Neste
caso não nos darão nenhuma ajuda a aprender a integrar as nossas contradições.
E algumas
destas, em termos astrológicos, são simplesmente complexas demais para poderem
ser enfrentadas na infância.
Com isto
refiro-me a configurações que ligam Vénus ou a Lua a Saturno ou Chiron
– estas
requerem uma sabedoria que só o tempo e a experiência podem dar
– ou aos
planetas exteriores, que para uma criança, são praticamente impossíveis de
integrar a nível pessoal.
Triângulos
nas Famílias separadas ou nos divórcios
–
oposições entre 4a e 10a
É possível
que dentro da família se desenvolvam triângulos através da separação entre os
pais.
Muitas
vezes isto é descrito no mapa natal através de oposições entre a 4a e a 10a
casa.
Tais
oposições não indicam inevitavelmente que os pais se separaram mas,
normalmente, existem conflitos e separação a nível psicológico se não mesmo a
nível físico.
Vivemos a
oposição entre os nossos pais e sentimo-nos obrigados a optar por um dos lados.
Induz-nos
a tal a nossa própria incapacidade de enfrentar uma situação do género e às
vezes um dos progenitores não consegue impedir-se a si mesmo de tentar usar a lealdade
da criança como arma contra o outro progenitor.
No fundo
nesta situação, como sempre, comporta uma contradição dentro do indivíduo,
vivida primeiro através dos progenitores, simbolizados pelos planetas opostos
no mapa natal e que no fim terá de ser enfrentada a nível interior pelo próprio
indivíduo.
Mas a
não-consciência por parte dos pais faz com que o processo seja mais longo e
difícil.
Mesmo se não
estamos sujeitos a pressões dos pais, é improvável que possamos enfrentar
lealdades divididas em tão tenra idade.
E em
circunstâncias destas seriam necessários progenitores extremamente sábios e
conscientes para poderem estabelecer entre si um acordo de forma a não fazer
nenhum tipo de pressões emotivas sobre a criança.
Normalmente,
se os pais se sentem tão infelizes que decidem separar-se, não conseguem uma
atitude que propicie a cooperação.
As
separações libertam em nós emoções primordiais que podem implicar desejos de
vingança, especialmente se a separação foi causada por um triângulo.
Muitas
vezes a criança acaba por sentir-se como uma bola de futebol num jogo
especialmente agressivo.
Um dos
progenitores
–
principalmente se ele ou ela é o Traído
– pode
tentar apropriar-se da criança, declarada ou subtilmente, de forma a magoar o
Traidor.
Alguns
guiõesde telenovelas parecem ser lidos por muita gente;
por
exemplo,
"O
teu pai deixou-me porque era um sacana.
Era
incapaz de amar, fosse quem fosse!.
Ele não
amava nenhum de nós, senão não se tinha ido embora com aquela
mulher".
A
mensagem recebida para uma criança do sexo masculino seria :
"Espero
que tu não sejas igual a ele quando cresceres";
A
mensagem recebida para uma criança do sexo feminino seria
"Espero
que não cases com alguém como ele quando cresceres".
Estas
mensagens não têm de ser faladas, podem ser comunicadas através de um
comportamento de mártir inconsolável, por um dos pais que se sentiu vitima de
abandono .
O Traído,
quando os pais se separam, normalmente terá um grande poder sobre a psique da
criança por causa da pena que consegue provocar-lhe.
As
crianças não estão preparadas para se distanciarem da situação e olharem para a
separação com objectividade;
A culpa
tem de ser de alguém, ou delas próprias ou de um dos pais.
E as
crianças também não se atrevem a rejeitar essas mensagens, porque as aterroriza
a ideia de fazerem zangar o progenitor que agora é o único que se ocupa delas.
Na nossa
sociedade, quando os pais se separam, normalmente a mãe fica com a criança
– mesmo
que esta não seja psicologicamente a melhor solução para a criança.
Existem
muitos casos em que o pai poderia estar melhor equipado, emocionalmente, para
educar a criança, mas os tribunais raramente decidem assim.
A mãe tem
de ser decididamente terrível para que lhe tirem a criança.
Se os
progenitores não forem legalmente casados, os direitos do pai em termos de
acesso à criança podem ser inexistentes.
É lícito
interrogarmo-nos se um pai merece realmente que os filhos lhe sejam tirados e
virados contra ele só porque traíu a mulher, mas os triângulos têm a capacidade
de gerar consequências emocionais muito desagradáveis, que se transmitem
através das gerações e alimentam outros triângulos.
As
manifestações da cegueira humana são muitas e pais divorciados ou separados
– ou
mesmo aqueles que continuam a viver juntos mas emocionalmente distantes
–
geralmente pedirão à criança que escolha um ou outro.
O amor
pelo outro progenitor tem de ser negado, reprimido, silenciado.
Isto é
terrivelmente desumano.
Se uma
pessoa nos fere, é-nos difícil suportar que alguém que amamos mostre afecto
pela pessoa que nos feriu.
Se
existem oposições entre a 4a e a 10a casa no mapa da criança, então a laceração
interior da própria criança coincide com a separação dos pais.
Ao longo
dos anos de como astróloga, tenho visto muitos, muitos exemplos onde a pessoa
teve de negar um enorme amor por um dos progenitores em circunstâncias destas.
A própria
pessoa pode acreditar nessa negação como sentimento real.
Quando
vejo Vénus, Lua, Neptuno, Sol ou Júpiter numa casa parental, sei que ali existe
uma potente ligação com o progenitor, mesmo que a relação com ele, também tenha
sido muito difícil.
Se
qualquer um destes planetas está na 4a casa, descreve sentimentos fortemente
positivos e até idealizados pelo pai.
Mas se
houve uma ruptura e o pai se foi embora
– ou, com
oposições da 10a casa, mesmo que não se tenha ido embora
– pode
demonstrar-se impossível para a pessoa manter-se consciente de tais
sentimentos.
A
ambivalência pode ser demasiado dolorosa e, a sensação de deslealdade em
relação à mãe, grande demais para ser suportável.
Talvez o
pai se tenha ido embora por causa de outra relação.
Talvez
ele volte a casar e tenha outros filhos.
Então o
problema complica-se porque os ciúmes da criança aliam-se aos ciúmes da mãe, o
que faz com que seja praticamente impossível para a criança reconhecer a sua
ligação emocional com o pai.
A relação
é destruída e a criança, que entretanto cresceu, diz
"Oh,
não vi muito o meu pai desde o seu divórcio.”
“Tenho
muito pouco a ver com ele.”
“Vejo-o
ocasionalmente e não temos uma grande relação".
Todos os
sentimentos positivos, amorosos, foram empurrados para o inconsciente porque
não podemos enfrentar lealdades divididas;
Reprimimo-los
porque temos de sobreviver psicologicamente e temos de viver com a mãe.
Se
existem planetas na 4a casa que sugerem amor e idealização e os pais se
separam, os sentimentos pelo pai que serão reprimidos podem fornecer alimento
para triângulos posteriores;
e isto é
aplicável a ambos os sexos.
Não será
surpreendente que uma mulher com uma familiar deste tipo, com este tipo de
configuração no mapa astral, acabe por desempenhar o papel de Instrumento de
Traição e se ligue a um homem casado.
Pode
igualmente dar consigo a fazer de Traída, casada com alguém que é igual ao pai
dela…
Ou pode
tornar-se no Traidor por defesa, porque está decidida a não acabar como a sua
mãe.
Um homem
com este mapa pode inconscientemente acabar por escolher uma mulher como a mãe
e depois, para seu grande horror, dar consigo no papel do pai.
O
triângulo pode ser inevitável porque quanto mais inconscientes forem os
sentimentos em relação ao progenitor amado que falta, certamente mais eles
emergirão numa relação adulta posterior.
Estes
sentimentos inconscientes também podem cruzar os sexos, não se limitando necessariamente
a mulheres que procuram o pai ausente noutros homens, ou a homens que dão
consigo próprios na mesma situação do pai deles.
Um homem
que perdeu o pai e tem Vénus ou Neptuno ou a Lua na 4a casa, pode procurar as
qualidades do pai em mulheres.
Ou, se
for homossexual, pode procurá-las noutro homem.
Temos de
pensar nestas dinâmicas, não com uma perspectiva de demarcações sexuais rígidas
mas como modos de tentar curar uma ferida.
Além
disso, reflectem os nossos esforços de entrar em contacto, nas nossas relações
adultas, com qualidades arquétipos que vimos primeiro no progenitor e que,
afinal, temos de encontrar em nós próprios.
Por
carregarmos connosco algo de não resolvido e não curado podemos recriar
fielmente o casamento dos nossos pais.
Depois
podemos dar connosco no mesmo triângulo, em qualquer um dos três lados, com um
ou ambos os sexos.
Estas
dinâmicas inconscientes parecem muito óbvias quando começamos a reflectir sobre
elas, visto de fora;
a
dificuldade está em fazê-lo quando nos encontramos no meio de um triângulo.
É muito
fácil, se sou a astrólogo ou a terapeuta imparcial
– se é
que pode existir total imparcialidade?
– ou
mesmo o amigo com alguns conhecimentos de psicologia.
Podemos
ver claramente as raízes familiares de muitos triângulos adultos se somos
observadores, mas é extremamente difícil vê-los quando estamos envolvidos
neles.
E quanto
menos consciência tivermos das nossas dinâmicas familiares, mais este triângulo
será emocionalmente compulsivo e mais difícil será vê-lo claramente.
Mesmo que
o vejamos, podemos continuar incapazes de resolvê-lo porque temos de viver a
situação até ao fim; não se cura nada só com exercícios racionais.
Mas as
emoções que o triângulo traz à superfície podem mudar e o resultado final pode
variar muito interiormente, se não mesmo exteriormente.
O aspecto
triste dos triângulos é que toda a gente perde; mais cedo ou mais tarde, a um
nível ou outro, as três pessoas acabam por ser feridas.
Mesmo que
o Instrumento de Traição acabe por conseguir quebrar uma relação existente e
"ganhar" o objecto de amor por quem lutou, é uma vitória de Pirro -
no fim, o Traidor tem sempre de escolher, por isso, mesmo que ganhe algo há
sempre outra coisa que perde.
É
igualmente uma vitória de Pirro (Rei militar da macedónia) a do Traído que
consegue "recuperar" o parceiro errante.
Exercitámos
o nosso poder edipiano e regressámos à derrota edipiana original, que sofremos
na infância.
Mas o que
é que ganhámos e com o que é que temos de viver depois?
O
ressentimento parece ser inevitável, qualquer que seja a posição que ocupamos
no triângulo.
Se somos
o Instrumento de Traição, levamos alguém a fazer uma escolha muito dolorosa e,
muitas vezes, ao sofrimento emocional acrescem dificuldades económicas que
também trazem ressentimentos.
Mas
principalmente, se continuarmos a não ter consciência de nós próprios e destas
dinâmicas, não fizemos nada para curar a divisão interior que está por trás do
triângulo.
Obtivémos
apenas uma solução exterior;
nada
mudou realmente.
Inseguranças
que criam triângulos
– Saturno
e Chiron
Existe
outra consequência dos triângulos familiares:
A
potencial alienação entre nós e as outras pessoas do nosso sexo.
Uma
batalha edipiana não resolvida pode resultar numa falta de confiança na própria
sexualidade.
Se houve
uma situação de intensa rivalidade e competição com o progenitor do mesmo sexo,
inevitavelmente terá efeitos, a nível das nossas amizades e do modo como, mais
tarde, interagimos com as pessoas do nosso sexo.
Se uma
mulher tem uma mãe que é uma rival e invejosa insuperável, nas mãos de quem
sofreu uma dolorosa e humilhante derrota infantil, a sua confiança na própria
feminilidade pode ser corroída.
E porque
não confia em si própria, não confiará nas outras mulheres.
Todas
parecerão ter o poder de lhe "tirar" aqueles que ama.
Esta
desconfiança no próprio sexo pode ser muito aguda. Uma mulher pode ter uma
amizade fantástica com outra mulher, depois conhece um homem maravilhoso,
envolvem-se um com o outro, e o que é ela faz quando chega a hora de
apresentá-lo à amiga?
A
corrente inconsciente de ansiedade e suspeita pode tornar as coisas muito
difíceis, e inconscientemente a mulher pode mesmo preparar-se para uma traição.
Pode
inconscientemente escolher como amigas aquelas que personificam o seu conflito
não-resolvido com a mãe, por terem elas também conflitos não-resolvidos com as
próprias mães.
O mesmo
se aplica aos homens;
se um
homem viveu uma situação de competição destrutiva com o pai, a questão da
rivalidade passar-lhe-á sempre pela cabeça, em qualquer relação onde se envolva
mais tarde, porque os outros homens parecer-lhe-ão sempre rivais.
Tem de
estar sempre alerta.
Não se
trata de possessividade no sentido comum do termo; as suas raízes são muito
diferentes.
Aspectos
de Vénus com Saturno ou Chiron podem contribuir para esta dinâmica, não porque
são intrinsecamente edipianos mas porque reflectem inseguranças enraízadas no
triângulo familiar.
Aspectos
de Marte com Saturno e Chiron podem também indicar profundas inseguranças
sexuais que são intensificadas pelos triângulos familiares e levam a
sentimentos de derrota.
Esta
série de aspectos pode induzir a uma repetição da derrota mais tarde, ou a uma
tentativa de curar a ferida provando a própria potência sexual através dos
triângulos.
Não
existe um padrão astrológico único que descreva uma propensão para os
triângulos mas, antes, muitas diferentes combinações que podem descrever diversas
imagens de progenitores e de respostas a estes, e diversos modos de reagir à
natural e inevitável fase edipiana da infância.
Vénus-Saturno
e Vénus-Chiron não "fazem" uma pessoa cair em triângulos, mas
descrevem uma profunda e inata consciência dos limites humanos que, na
infância, quando não existe uma compreensão real do que isto pode oferecer de
positivo, pode levar a criança a sentir-se inadequada e perturbada.
A perda
ou alienação de um progenitor amado será então atribuída a uma culpa própria e,
mais tarde na vida, sente-se que não se pode "segurar" um parceiro
porque haverá sempre um ou uma rival que no-lo há-de roubar.
As
experiências edipianas explodem com frequência na meia-idade porque os planetas
numa posição-chave por essa altura (Saturno, Neptuno e Urano, como j+a referi
em programas anteriores) podem desencadear configurações que nos metem em
contacto com questões da infância.
No grupo
de trânsitos da meia-idade há muita vida não-vivida que pede para se exprimir e
triângulos familiares não-resolvidos que conseguiram permanecer ocultos até
então podem finalmente emergir por causa da vida psíquica não-vivida que
carregam consigo.
Mas
depende de quanto é forte o conflito;
Pode
muito bem ocorrer muito antes.
Há
pessoas que experimentam triângulos desde os seus primeiros relacionamentos.
Nem todos
os triângulos têm raìzes familiares e estas também podem envolver algo de mais
profundo.
Bem nos
podemos perguntar o que existirá de mais profundo do que as dinâmicas edipianas
mas, como terá dito uma vez Jung, até o pénis é um símbolo fálico.
Se existe
um padrão familiar não-resolvido, como as questões venusianas de que tenho
falado, há fortes probabilidades de que surja na nossa vida exterior sob
influência das circunstâncias propícias.
Essa,
para algumas pessoas, pode ser a única forma de conseguir algum tipo de cura ou
solução as suas magoas.
Mas por
trás da questão parental está a questão do arquétipo:
Porque é
que procuramos o amor desse progenitor específico e o que é que esse progenitor
representa para a nossa alma?
Isto está
invariavelmente ligado com o que precisa de ser desenvolvido em nós
– o nosso
próprio destino.
Na
meia-idade, se há pedaços importantes de nós que permaneceram subdesenvolvidos,
estes emergirão com violência, especialmente com a oposição de Urano à sua
posição natal ( Úrano oposição a Úrano) .
E, muitas
vezes, o primeiro lugar onde encontramos esses pedaços bloqueados de nós
próprios é noutra pessoa qualquer.
É o modo
mais característico que tem a psique de bater à porta e requerer integração.
Esta
necessidade de nos tornarmos em algo mais do que já somos pode iniciar-se com
uma atracção inesperada.
Pedaços
não-vividos de nós próprios podem aparecer-nos num rival.
Surpreendentemente,
a nível psicológico o rival pode ser mais importante para nós do que a pessoa
pela qual lutamos.
Mas se
não vivemos nenhum tipo de triângulo antes, o aparecimento de um na meia-idade
pode não implicar necessariamente um problema familiar não-resolvido.
E se
implica, então o problema tem de ser visto num contexto mais alargado.
Triângulos
que implicam vida não-vivida
Agora, o
que estará realmente por trás das dinâmicas dos triângulos?
- por trás dos modelos parentais e das defesas
e jogos de poder e de todas as outras razões aparentemente "causais"
para que os triângulos entrem nas nossas vidas.
Creio que
existe sempre um elemento de vida não-vivida em todos os triângulos e, por
vários motivos, às vezes parecemos ser incapazes de o descobrir, a não ser
através do stress emocional extremo criado pelos triângulos.
A traição
é uma experiência-tipo que constitui o nosso principal instrumento de
maturação.
Isto não
significa que temos de nos tornar todos em cínicos amargos;
Mas é
importante reconhecer de que modo as nossas fantasias sobre como a vida e o
amor deveriam ser nos impedem de crescer e de nos tornarmos plenamente membros
da família humana.
A traição
é o meio através do qual estas fantasias são individualizadas e reconhecidas.
Tentamos
fechar-nos, a nós e a outras pessoas, no nosso mundo-de-fantasia que é suposto
compensar-nos pelos sofrimentos da infância.
Dado que
todas as infâncias comportam sofrimento, as suposições ingénuas que carregamos
connosco são também arquétipos e reflectem um mundo-criança alternativo, que se
parece com o Paraíso na sua inocência e estado de fusão com o progenitor
divino.
A
serpente no Jardim do Éden é, como tal, a imagem deste papel do arquétipo da
Traição, que é inerente ao estado de inocência e que mais cedo ou mais tarde se
ergue para destruir a nossa fusão.
Não
existe uma fórmula para lidar com a dor da Traição.
Mas uma
perspectiva arquetípica pode ajudar-nos a ver as coisas de outra maneira,
embora a dor não possa ser explicada ou afastada.
Não há
nenhum remédio para este tipo de dor.
Mas
existe uma diferença entre a dor cega e a dor que é acompanhada pela
compreensão, que ser obtido pelo seu mapa astral;
A segunda
tem um efeito transformador.
Quando
não se tem consciência de nós próprios, os triângulos tendem a repetir-se nas
nossas vidas
–
personagens diferentes,
- o mesmo
guião, a mesma telenovela!
Alguns
triângulos são verdadeiramente transformadores; destroem um velho modelo e a
nova relação é genuinamente muito mais feliz e gratificante, ou o triângulo
serve o propósito de libertar energia e potencialidades interiores, e seja que
a velha relação seja restabelecida ou que se acabe por ficar sem relação
nenhuma,
tudo
mudou!
Mas nós
ainda somos os mesmos, por quanto possamos mudar a nossa vida exterior, e se
existe uma questão interior não enfrentada, os mesmos padrões começarão a
emergir nas novas relações.
A
compatibilidade pode ser maior com uma outra pessoa, mas temos sempre de lidar
com a nossa própria psique.
Um
triângulo pode ser como um grande trígono num mapa astral:
A energia
circula à sua volta, regressa a si mesma e não alimenta mais nada na vida da
pessoa.
Dentro
dos triângulos, as três pessoas têm tendência a projectar umas nas outras
elementos de si próprias.
O
triângulo mantém essas projecções no lugar e pode existir uma enorme
resistência a mudanças;
Poderíamos
mesmo dizer que o triângulo se forma porque existe resistência a mudanças e o
que quer que seja que procura uma expressão dentro de nós é experimentado
através de projecções ou espelhamentos.
Quando este
género de triângulo se quebra, as projecções regressam a casa outra vez.
É
libertada energia psíquica, seja através da morte ou da renúncia voluntária a
alguém.
O momento
em que isto acontece não é casual.
Da parte
de um, ou dois, ou mesmo dos três componentes do triângulo, há questões
inconscientes que chegaram finalmente a um ponto em que podem ser integradas,
mesmo que a única expressão disso seja “deixar andar”.
As
projecções começam a tornar-se conscientes no momento em que estamos prontos
para o fazer.
Não
acredito que se chegue a um verdadeiro perdão de nenhum outro modo.
É uma
espécie de dom; não pode criar-se com um acto de vontade.
É muito
triste ouvir o Traído dizer "Perdôo-te" não porque lhe vem do
coração, mas como forma de conseguir de volta o parceiro perdido.
Por
detrás desta frase, pode não existir perdão nenhum (embora isto possa acontecer
a nível não totalmente consciente), e assim a punição continuará eternamente.
O perdão
só pode chegar com o reconhecimento da própria cumplicidade com o triângulo,
qualquer que seja o nosso papel nele, e com o retirar das nossas projecções.
Antes
disso, o perdão não é verdadeiramente possível. Parece emergir apenas a partir
de algo que foi genuinamente integrado dentro de nós.
O
processo inteiro é transformador.
Não
podemos fabricar perdão se fomos traídos
- nem
fabricá-lo para nós próprios, se somos o Traidor.
A única
coisa que podemos fazer é trabalhar para integrar aquilo que pertence à nossa
própria alma.
O progenitor
saturnino que nos rejeita e depois reaparece num triângulo disfarçado de
parceiro frio e que nos rejeita também, pode estar ligado à nossa necessidade
de adquirir limites definidos na nossa vida.
Se virmos
esta experiência saturnina fundamental de uma perspectiva mais distante, o que
é, afinal, a rejeição senão alguém que estabelece limites que para nós são
insuportáveis?
Pode ser
a nossa falta de limites definidos a atrair-nos para um triângulo onde somos o
Traído, rejeitado por um parceiro saturnino que diz "Não posso suportar
esta claustrofobia emocional; quero separar-me".
Ou
podemos ser o Traidor, em fuga de um parceiro cujas necessidades emocionais nos
parecem sufocantes mas que secretamente reflecte a nossa incapacidade de lidar
com a solidão.
As duras
e dolorosas lições que aprendemos com este tipo de experiência são lições sobre
o que existe de subdesenvolvido dentro de nós.
Podemos
ter de descobrir as nossas pulsões primitivas se Plutão está na nossa 10a ou 4a
casa.
Mas
inicialmente podemos não aceitá-las como uma coisa nossa, e dizer
"A
minha mãe era terrivelmente manipuladora e dominadora" ou
"O meu pai era tão dominador, controlava
tudo e todos."
Porque é
que as pessoas se tornam manipuladoras e dominadoras?
Quando
exprimimos qualidades plutonianas numa relação, não o fazemos por divertimento,
mas porque a relação é equiparada com a sobrevivência, e temos uma necessidade
desesperante de garantir que a pessoa amada permaneça ao nosso lado.
Fazemos
entrar em acção Plutão quando nos sentimos ameaçados.
As
pessoas tornam-se manipuladoras porque se sentem aterrorizadas com a ideia de
perder o objecto do seu amor.
O objecto
de amor representa a própria sobrevivência e a manipulação parece-lhes ser a
única forma possível de garantir a continuidade da relação.
Todos nós
somos capazes de o fazer, se colocados num certo nível de envolvimento e de
ameaça.
Se não
reconhecermos como nossos esses atributos plutonianos e os mantivermos
projectados no progenitor, eles podem acabar por dar vida a um triângulo;
Então
teremos de reconhecer o quanto nós próprios podemos ser possessivos.
Ou
podemos arranjar um parceiro profundamente possessivo e ciumento.
Podemos
chegar ao ponto de dizer
"Ah,
sim, escolhi alguém exactamente como a minha mãe/o meu pai."
Este é um
importante passo introspectivo, mas é só o início.
Esta
qualidade possessiva do progenitor é descrita por Plutão na nossa 10a ou 4a
casa.
Resta-nos
sempre descobrir essa qualidade dentro de nós próprios.
Muitas
vezes só descobrimos que temos um Plutão através de uma experiência de traição;
Ele é só
um vazio no mapa até que um triângulo o desenterra e, então, inesperadamente,
damos com o nosso Plutão pela primeira vez.
Descobrimos
que sentimos apaixonados, que precisamos de intensidade, que o desespero nos
pode tornar manipuladores e que o controlo pode às vezes parecer a única forma
de sobreviver.
Este
processo de auto-descoberta pode ser uma experiência assustadora e humilhante,
mas permite-nos tornarmo-nos plenamente naquilo que somos.
A integração
psíquica é a teleologia de todos os triângulos.
Mesmo
quando os planetas exteriores estão envolvidos em triângulos parentais, a
qualidade no progenitor à qual somos tão ligados è, na realidade, algo que
pertence à nossa alma.
Este
"algo" pode implicar alargarmo-nos para além dos nossos limites
pessoais e deixarmos que um maior ou mais profundo nível de consciência entre
nas nossas vidas, mas está indubitavelmente ligado ao nosso caminho individual
na vida.
Quando
encontramos símbolos astrológicos com os quais entramos em contacto, primeiro
através dos pais e, mais tarde, através de um triângulo onde repetimos essa
mesma experiência, há algo em nós que tem de ser expresso através da
experiência empírica (na pratica) e pode continuar a manifestar-se até
encontrar um modo de o vivermos.
Os
planetas que representam significadores parentais no mapa não descrevem apenas
modelos de progenitores; descrevem dimensões não-vividas de nós próprios,
principalmente quando não condizem com o resto do mapa.
Mesmo que
os progenitores personifiquem o planeta de forma criativa, é sempre o nosso
planeta, e pertence ao nosso próprio destino.
Um
planeta na 4a ou na 10a casa, ou em aspecto maior ao Sol ou à Lua, pode não ser
evidentemente posto em acção pelo progenitor, mas fará parte daquilo que
experimentamos através dele.
Se o
progenitor não viveu criativamente o padrão arquétipo simbolizado pelo planeta,
ser-nos-á mais difícil entender com que energia lidamos
- e, como
tal, podemos não nos aperceber exactamente do que vivemos através do triângulo
que aparecerá mais cedo ou mais tarde nas nossas vidas.
Não é só
um modelo parental não resolvido, apesar de este poder ser um importante elemento
a desenvolver; é, em última análise, o nosso próprio planeta e, como tal, é
algo que pertence à nossa alma.
Faz parte
da nossa herança psicológica, mas temos de lhe dar uma forma.
Mesmo os
triângulos declaradamente edipianos estão ligados à nossa vida interior, porque
aquilo que amamos ou odiamos no progenitor é algo que nos pertence.
Mas temos
de encontrar um modo próprio de o viver.